A Arquitetura habitacional

Sabemos que a Arquitetura é uma forma de Arte, complexa e multidisciplinar, abarcando a Matemática, Física, Filosofia, Sociologia, Historia, Tecnologia, Artes plásticas entre outras. Destacando, o sentido Estético, que é muito considerado e é importante, está muito dependente das variantes do seu tempo, da sua atualidade. No campo especifico da Arquitetura de habitação o binómio estética-função/utilidade, requer um equilíbrio bem estudado e elaborado, para se atingir o seu propósito primeiro, o da melhor habitabilidade possível. Quando a estática se sobrepõe, temos por exemplo, uma escada bela e inovadora, mas sem apoio efetivo, por ausência de corrimão ou apoio só de um lado, é insegura e mal elaborada, uma varanda com um parapeito de barras horizontais que equivale a uma escadinha para o abismo.

Um projeto em forma de caixote virado para dentro para preservar a privacidade, sem qualquer elemento para o exterior de sociabilização, como varandas, janelas amplas, terraço, quintal, jardim, etc. e ainda por cima de cor escura, revela um conceito de ausência de sentido estético relativo ao meio circundante, quer urbanístico quer sociológico. A sujeição ao gosto do cliente, em função do medo do outro, da sua privacidade, tem originado uma paisagem de blocos onde predomina o cinzento-preto, como caixas fortes, inexpugnáveis e não convidativas.

Eu vivi um tempo e numa cidade em que as portas das casas se deixavam abertas, os jardins ou quintais convidavam a um convívio, pela abertura à via publica, as janelas e varandas não eram só aberturas de ar e luz, também eram um meio de socialização. As flores nas varandas, janelas, terraços e jardins, proporcionavam um bem-estar não só a quem as tratava como a quem por lá passava. É claro que me vão saltar em cima, que não percebo nada de arquitetura, da moderna arquitetura, que os tempos são outros, que são gostos, que estou desatualizada, etc. mas francamente e realisticamente, onde se sentem bem, ou vão passar férias e tiram montes de fotografias, as pessoas e com certeza esses arquitetos enraivecidos? Nos bairros antigos, na Grécia, todo aquele branco e as buganvílias, os Países com aquelas ruas estreitas cheias de pátios e varandas repletas de vasos com flores… Marrocos, Holanda, França, etc. Não é bonito?

Outro aspeto na tendência dos últimos anos, é projetar a habitação, não como um espaço que reproduz e vai de encontro às necessidades atuais e prementes das pessoas, mas como um negócio de compra e venda, maximizando ao máximo as áreas de construção. ora vejamos :

  • A necessidade de secar a roupa e de não a exibir para o exterior, pelo menos para a rua principal. A maior parte dos prédios das ultimas décadas, para rendimentos baixos e médios, tem um estendal para fora, sem proteção superior, alem de ser incomodo, está sujeito não só à chuva, como ao que possa cair de cima ou apanhar com o lençol do vizinho na janela. Quando temos exemplos de soluções ótimas, fazendo uma varanda fechada com blocos alternados (espaços vazios) ou pequenos compartimentos arejados e estanques, varandas fundas ou varandas com estores, por exemplo.
  • A existência de só uma casa de banho para um t2 ou t3, é absolutamente anti-higiénico e desumano. A maioria das casas de banho são interiores, sem luz natural, nem sequer um entrada de luz por meio de materiais, como o tijolo de vidro, para outra divisão.
  • A exagerada dimensão da sala comum, em detrimento dos outros compartimentos, com quartos reduzidos, wc minúsculo e escassa arrumação, é uma prostituição total, é uma cedência a um liberalismo financeiro, despojado das responsabilidades sociais, inculto e seguidor de modas.
  • A diminuição crescente do espaço da cozinha, que é um espaço critico, perigoso, e a sua inserção na sala, cada vez mais kitchenette, substituindo a despensa por armários embutidos e máquinas embutidas, não tem a ver com “os tempos modernos” ocidentais, em que o homem e a mulher trabalham e não tem tempo para cozinhados longos e complexos, associado à geração das pizas, dos hamburgers, do takeaway e da comida pré-cozinhada, mas sim com a imposição de uma moda, à Ameican way of life, desfasada dos nossos hábitos e necessidades, mais saudáveis e equilibrados.
  • A falta de arrumação embutida ou insuficiente, e de arrecadações, é mais uma causa da instalação de marquises e da redução de espaço livre na habitação, num ambiente minimalista, sem livros, sem discos, sem objetos significativos. Onde pôr o aspirador, os objetos de limpeza, a bicicleta, o triciclo, as memórias, algumas tralhas sobrantes?
  • Lembram-se de ver alguns prédios antigos, em que o r/ch tinha direito a um quintal/jardim ? e havia uma entrada para a traseira do prédio com as respetivas garagens? Bonito, cómodo e ideal , não acham? E agora?
  • Alguma da nossa arquitetura medieval ou de influência medieval tem arcadas, como forma de proteção, não só da chuva e vento, mas também dos veículos ou dos objetos caídos ou arremessados de cima. Hoje, só muito pontualmente, em casas de gama alta, ainda se vão encontrando, Será assim tão dispendioso, a sua ampla utilização?

Exemplos de soluções no património histórico de Lisboa, da classe baixa à media-alta, de como se ocultava a zona da lavandaria

Uma realidade, no atual estado da construção em Portugal, é a desvalorização crescente do arquiteto em Portugal, consumando-se o pior cenário na despensa da assinatura de um arquiteto no licenciamento dum projeto, o qual teve como consequência o elevado desemprego e muito baixas remunerações dos arquitetos. Está patente na falta de cuidado na construção de edifícios e na reconstrução de casas tradicionais, onde predomina a kitchenette, falta de zona de lavandaria e secagem de roupa e o que se está a generalizar, o cinzento escuro nos frisos das portas e janelas, substituindo o cinzento claro, amarelo e o azul lindíssimo original.

Mudam-se os tempos, mudam-se os donos.

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